quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Produção científica e lixo acadêmico no Brasil

Por Rogério Cezar de Cerqueira Leite*

Dois artigos publicados recentemente pela revista britânica “Nature”, especializada em ciência, deixam o Brasil e, em especial, a comunidade acadêmica brasileira, profundamente envergonhados.

A “Nature” nos acusa, em primeiro lugar, de produzir mais lixo do que conhecimento em ciência. Nas revistas mais severas quanto à qualidade de ciência, selecionadas como de excelência pelo periódico, cientistas brasileiros preenchem apenas 1% das publicações.

Quando se incluem revistas menos qualificadas, porém, ainda incluídas dentre as indexadas, o Brasil se responsabiliza por 2,5%. O que a “Nature” generosamente omite são as publicações em revistas não indexadas, que contêm número significativo de publicações brasileiras, um verdadeiro lixo acadêmico.

O segundo golpe humilhante para a ciência brasileira exposto pela revista se refere à eficiência no uso de recursos aplicados à pesquisa. Dentre 53 países analisados, o Brasil está em 50º lugar. Melhor apenas que Egito, Turquia e Malásia.

Tomemos um exemplo. O Brasil publicou 670 artigos em revistas de grande prestígio, enquanto no mesmo período o Chile publicou 717, nessas mesmas revistas. O dado profundamente inquietante é que enquanto o Brasil despendeu em ciência US$ 30 bilhões, o Chile gastou apenas US$ 2 bilhões.

Quer dizer, o Chile, que aliás não está entre os primeiros em eficiência no mundo científico, é 15 vezes mais eficiente que o Brasil. Alguma coisa está errada, profundamente errada. A academia brasileira, isto é, universidades e institutos de pesquisas produzem mais pesquisa de baixa do que de boa qualidade e as produz a custos muito elevados. Há certamente causas, talvez muitas, para essa inadequação....


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Fonte: Observatório da Imprensa (Reproduzido da seção “Tendências/Debates” da Folha de S.Paulo, 6/1/2015; intertítulo do OI)

*Rogério Cezar de Cerqueira Leite, físico, é professor emérito da Unicamp e membro do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia e do Conselho Editorial da Folha de S.Paulo